É estranho. Eu me ouvia narrando toda a minha vida, todos os meus passos e o mais estranho é que minha mente narrava os próprios conflitos. Pensava em mim sempre em terceira pessoa do singular. Não era eu, era ela.
Caminhava até a geladeira para beber água e escutava. – Sua garganta estava seca, ela sabia que alguns goles de água não fariam descer o que estava preso ali.
Era tão mais confortante fazer do meu drama um drama. Eu, ela. Ao mesmo tempo personagem, ao mesmo tempo narradora. No fundo, eu queria mesmo é ser roteirista dessa vida vazia, dá lhe formas, conflitos para chorar, surpresas a cada capítulo, o desenrolar a cada página(dia).
Mas na verdade, essa vida ficou em branco. O meu drama tinha cheiro, tinha rosto, mas não tinha corpo. Eu sabia que podia vê-lo, sabia que poderia respirar sua indiferença, sabia que poderia provar suas mentiras e o mais doloroso é que sabia que não poderia apanhar o seu amor.
O amor não é físico? Talvez. Não poderia ter seu amor realmente em minhas mãos. Mas não o sentia nem subjetivamente perto de mim. Nem com arrepiar de um beijo. O fósforo e a gasolina não existiam. Deveria explodir quando você me tocasse. Você deveria queimar minha pele com a ponta da língua.
Não sei se vivo outra vez o complexo de amar sozinha, ou se realmente eu nunca o amei de verdade.
Ela na minha cabeça dizia:
- As lamentações tomaram corpo em um papel branco. Algo pelo menos estava meio cheio, ou na verdade meio vazio? Nardi não soube dizer de que papel era. O papel na sua frente, ou o papel de personagem principal dessa história? Talvez a imagem daquele homem, com seus olhos apertados e o sorriso que abria facilmente, até em cada mentira, tomava conta da sua história. Era hora de parar e escrever. Era hora de escrever um roteiro de si e para si.